2023
ELA LOBO
de ANA LÁZARO
encenação MARIA JOÃO LUÍS
com MARIA JOÃO LUÍS, SÍLVIA FIGUEIREDO
cenografia DANIELA CARDANTE
figurinos DINO ALVES
desenho de luz PEDRO DOMINGOS
assistência de encenação FILIPA LEÃO
fotografia ALÍPIO PADILHA
produção executiva DIANA ESPECIAL
ilustração do cartaz JOÃO LUCAS
operação de luz e som LUCAS DOMINGOS
assistência de produção FILIPE GOMES, SÓNIA GUERRA
direcção de produção PEDRO DOMINGOS
produção TEATRO da TERRA 2023 M/12
co-produção
Casa das Artes de V. N. Famalicão
Teatro Municipal de Bragança
Centro Cultural Raiano
texto editado em livro na colecção Originais Teatro da Terra
Duas Mulheres. Duas Mulheres desaparecidas. Duas Mulheres desaparecidas dentro de uma Floresta. Duas meninas dentro de um frasquinho a germinar. Duas fugitivas que acordam e adormecem para regressar aos mesmos medos, aos mesmos uivos, à mesma insónia, na mesma noite. Duas Presas com medo do escuro. Duas Predadoras que corriam pela cidade até que as pernas ficaram maduras e apodrecerem de vez. Dois troncos com braços, incapazes de resistir aos parasitas que os consomem a partir de dentro. Duas fêmeas com memórias de crias e de flor. Duas plantas a germinar numa estufa onde são limpas, podadas e vigiadas para que não se tornem pragas selvagens e descontroladas. Duas Mulheres sem nome. Duas Mulheres daninhas. Duas Mulheres que desapareceram para não comprometer a biosfera. Porque, afinal, uma Mulher daninha pode contagiar uma Floresta inteira.
AMOR DE DOM PERLIMPLIM COM BELISA EM SEU JARDIM
de FEDERICO GARCIA LORCA
encenação MARIA JOÃO LUÍS tradução EUGÉNIO DE ANDRADE
com ANTÓNIO SIMÃO, FILIPA LEÃO, MARINA ALBUQUERQUE
RITA ROCHA SILVA, TERESA FARIA, TERESA TAVARES e o músico
JOSÉ PEIXOTO
cenografia JOSÉ MANUEL CASTANHEIRA
composição e direcção musical JOSÉ PEIXOTO
figurinos CLÁUDIA RIBEIRO
desenho de luz PEDRO DOMINGOS
assistência de encenação, produção executiva DIANA ESPECIAL
fotografia ALÍPIO PADILHA
ilustração do cartaz JOANA VILLAVERDE
operação de luz e som LUCAS DOMINGOS
construção cenográfica BENTO CORREIA
assistência de produção FILIPE GOMES, SÓNIA GUERRA
direcção de produção PEDRO DOMINGOS
produção TEATRO da TERRA 2023 M/12
A incompreensão é o motor da vida, da obra e da morte de Lorca. Artista da tragédia, encontrou na incompreensão mútua dos géneros masculino e feminino, o ponto de partida para esta inclassificável trama poética. Ele próprio chega a escrever a propósito de AMOR DE DOM PERLIMPLIM...:“é uma obra grotesca, uma farsa que termina em tragédia.”
Dom Perlimplim homem de meia idade, abastado, mas inexperiente nos negócios do amor, deixa-se convencer pela sua criada a casar com uma jovem muito mais nova, sua vizinha. Belisa é manipulada pela mãe para alinhar num casamento de conveniência, sem a paixão que cultiva com um correspondente anónimo. A viúva, cuja única preocupação é assegurar a sua estabilidade económica, alicia a filha para um casamento recheado, com a possibilidade de atrair outros homens, augurando a infidelidade da filha.
Lorca quer o drama no público, não nas personagens, cujos traços característicos são habilmente desconstruídos, para que a nossa percepção se debata com a visão que o poeta projecta, de um mundo à frente do seu tempo. A montagem do Teatro da Terra transporta para a contemporaneidade os temas universais e intemporais do amor e da traição.
Abertura e lutaJOÃO LUCAS
ROMEU E JULIETA
de WILLIAM SHAKESPEARE
encenação MARIA JOÃO LUÍS
com
AFONSO MOLINAR, BRUNO AMBRÓSIO, CÁTIA NUNES, FILIPE GOMES,
INÊS CURADO, JOSÉ LEITE, MIGUEL SOPAS, PAULO LAGES, PEDRO MOLDÃO
RODRIGO SARAIVA, SÍLVIA FIGUEIREDO, TADEU FAUSTINO
tradução e adaptação FERNANDO VILLAS-BOAS
cenografia ÂNGELA ROCHA
criação musical e ilustração JOÃO LUCAS
figurinos JOSÉ ANTÓNIO TENENTE
desenho de luz PEDRO DOMINGOS
assistência de encenação FILIPA LEÃO
fotografia DANIEL NUNES
produção executiva ARTUR CORREIA
assistência de produção FILIPE GOMES
direcção de produção PEDRO DOMINGOS
produção
TEATRO DA TERRA 2023 M/12
co-produção
NOVO CICLO ACERT
CASA DAS ARTES DE VILA NOVA DE FAMALICÃO
Em Verona, duas famílias rivais, os Montéquio e os Capuleto, assistem ao enamoramento dos seus filhos. Apesar das disputas familiares, Romeu e Julieta encontram-se e apaixonam-se profundamente. Desafiam as convenções e o ódio que há décadas separa as suas famílias, casam secretamente, mas uma série de trágicos equívocos culmina na morte prematura de ambos, selando o seu amor como a grande história de paixão amaldiçoada.
Com uma linguagem contemporânea e uma estética visual ousada, ROMEU E JULIETA, explora temas intemporais como o amor, a violência, o ódio e a reconciliação. A intensidade da paixão entre os protagonistas, refletida em interpretações polifacetadas, ampliam a energia e regeneram a violência contida, no conflito entre as famílias.
Apesar de não abordar directamente a luta de classes, é possível interpretar alguns elementos como um reflexo de tensões, rivalidades, ou conflitos sociais na divisão entre Montéquios e Capuletos. Ao criar um mapa emocional intenso e provocativo, lembra-nos a universalidade do sentimento humano e do poder transformador do amor, mesmo em tempos sombrios e complexos como os nossos.
ROMEU E JULIETA é uma reflexão social e política, que destaca, sobretudo, a necessidade de superar a diferença e o preconceito, e a importância de encontrar um terreno comum onde a paz possa prevalecer.
Para apreciarmos a extraordinária inversão de valores que a peça Romeu e Julieta trouxe, basta vermos uma versão poética contemporânea da mesma história, colhida em novelas italianas, à qual Shakespeare deitou mão para construir o seu enredo. The Tragical History of Romeus and Juliet (1562), de Arthur Brooke, não entroniza os dois adolescentes e o seu amor impaciente, como faz a versão de Shakespeare, no que ficou a ser a fonte, afinal, do culto da juventude que ainda está nos nossos hábitos e que esta peça inaugurou (R&J é de 1595-96, uma distância que por si só mostra a popularidade do poema). Pelo contrário: o conto em verso de Brooke oferece várias lições: o autor toma o partido dos pais, naturalmente, à luz dos costumes da época, e dá o nome de “desejo desonesto” à força que une o par, além de tratar Julieta como “donzela cheia de vontades” - a mesma ofensa com que o pai Capuleto castiga a filha no drama de Shakespeare (e nesta versão portuguesa), no discurso violento em que ameaça deserdá-la, caso não case com o noivo escolhido.
Desta fonte (e de outras semelhantes, na prudência com que tratam o fogo juvenil), Shakespeare extraiu uma história radicalmente diferente. Desde logo, três personagens menores são aumentadas na peça para se tornarem forças no drama: Mercúcio, a Ama e Tebaldo, todos, de algum modo, anti-heróis, inimigos daquela união em nome da camaradagem masculina, dos limites da vontade feminina, e, por ordem e por fim, do respeito pelos fervores tribais das famílias.
Shakespeare mudou também a ordem e a importância relativa das peripécias, acrescentando outras, para criar uma precipitação irresistível. O tempo da acção encolhe para poucos dias, em vez dos meses da narrativa tradicional, e a união dos amantes cabe numa só noite, já sob a sombra da separação inevitável.
As mortes de Romeu e Julieta já não serão apresentadas como os justos castigos da sua irracionalidade e rebeldia (um termo muitíssimo negativo no vocabulário da época, e no do próprio Shakespeare).
Para elevar aquela união perturbadora da ordem daquela Verona imaginária, Shakespeare funde arrojadamente a sua paixão (e da sua época) pelo soneto de gosto italiano, com aquilo a que se pode chamar o princípio do teatro como espectáculo verbal, que o teatro do nosso tempo tantas vezes descura, mas que fazia a regra do teatro isabelino: um teatro para ser ouvido, ainda mais do que visto. Esta peça, por via da sua inspiração na fonte lírica italiana, mais exactamente petrarquista - a mesma de Camões -, junta ao enredo tenso uma exibição de luxo verbal que nunca se prejudicam mutuamente em cena. O verso carregado de lirismo serve para compactar emoções, dar expressão aguda a traços do carácter das personagens, e assim ajudar à construção de um tempo progressivamente comprimido. E aquela coincidência literária deve ser e pode ser plenamente aproveitada. É uma crença desta versão, a possibilidade da imitação da dicção lírica original. Para uma ilustração deste processo basta a cena do encontro, no baile, entre Julieta e Romeu enquanto desconhecidos, sendo que as deixas que vão trocando até se consumarem os dois beijos trocados constituem, em si mesmas, um soneto rimado, em que os versos regem a pauta de movimentos contidos. “É um livro, essa boca”, diz Julieta, num elogio à delicadeza com que Romeu soube responder ao desafio poético.
Esta versão acredita, portanto, no espectáculo verbal, e no poder do seu ritmo em toda a máquina cénica.
Fernando Villas-Boas